MOSAICO DO VINI

Muitas vezes um caquinho não tem significado, mas junto com outros pode compor uma bela imagem

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

30 SETEMBRO (Kita: carta à Mariana)


30 de Setembro 2011 - Carta à Mariana

Oi Mariana, tudo bem com vocês?

Venho aqui falar um pouco de minhas aflições com o Vinícius. Continuamos com o Programa todos os dias com ele, ele está avançando na linguagem (aumento de vocabulário, frases simples e diálogos simples), na interação (veja filme da escola) e imaginação (mentir).
 Mas com a mudança da escola em agosto, Vinícius passou por alguns momentos de estresse. Apesar de ele ter adorado a escola nova, ficou mais hiperativo que nunca. Voltou a fazer estereotipias que ele já havia perdido no inicio do Programa, como girar rodinhas e ligar e desligar ventiladores. Não mudamos nossas atitudes com ele, e voltamos a fazer tudo que fazíamos no inicio, quando ele parou. Tanto que um dia arrecadei todas as coisas redondas da casa e levei para o quarto da alegria, ficamos 10 min girando tudo, até ele se interessar por mim novamente. Estou procedendo certo? Tem alguma sugestão?
Também começou a prestar atenção em imagens da TV, ele pergunta "o que é isso", respondemos, e ele sai correndo e procura em casa ou na rua o objeto correspondente (p.e. porta, janela, lua, carro, poste de luz, etc..). O que parecia ser algo legal, porque aumentou muito o vocabulário, virou um grande estresse. Quando não somos rápido o suficiente para falarmos o nome do objeto, antes que ele suma da TV,  ele fica muito frustrado e chora compulsivamente. Desligo a TV e levo para o quarto dele e ficamos lá tentando acalmá-lo. É muito angustiante ver essa frustração..o que podemos fazer para ajuda-lo?
 Desculpe o desabafo, mas realmente preciso de idéias para trabalhar melhor isso
 Grande abraço
Kita

Resposta da Mariana Tolezani- Diretora da Inspirados pelo Autismo
Querida Kita,
Que bom ouvir notícias de vocês, muito obrigada!
Assisti ao vídeo do Vini na escola e chorei quando vi a interação dele no jogo e o sorriso quando a professora disse que ele havia ganhado. Que lindo vê-lo participando e feliz naquele momento! Estou com saudades dele!

Que ótimo que vocês continuam um programa diário com ele e que maravilha que ele se desenvolveu tanto nestes últimos meses, tanto na linguagem, como na interação e imaginação! Uau, ele está mentindo para ganhar alguma vantagem?

Quanto à volta das estereotipias desde que ele mudou de escola, eu permitiria e me juntaria a esses comportamentos, como vocês vêm fazendo. A mudança de rotina fez com ele tivesse que lidar com muitas situações imprevistas por ele, o que provavelmente levou ao estresse pela sensação de perda do controle que ele já havia adquirido em relação à rotina anterior. Eu procuraria oferecer a ele:
* muito controle para ele nesse momento em suas sessões em casa (ele sentir que tem o controle);
*explicações da rotina diária e semanal (aliadas a um quadro visual de rotina);
*opções para ele escolher, tanto na alimentação, como nas peças de vestimenta, nas atividades em casa, e inclusive até certo ponto na escola;
*atividades físicas para ele descarregar e se acalmar
*ter um mediador na escola que aja como intermediário nas relações entre o Vini e os colegas, e o auxilie em quaisquer adaptações necessárias na escola, como o ambiente físico, os materiais escolares, e o equilíbrio entre o estilo responsivo e diretivo de interações. Se Vini precisar se engajar em ismos na escola, que ele tenha espaço para isso. Dependendo do grau de distração que o ismo for para as outras crianças da sala, podemos sugerir que Vini fique naquele momento no fundo da sala ou até que saia um pouco da sala com o mediador para fazer sua integração sensorial. Investigar o ritmo individual de Vini e estar atento para sugerir a ele “intervalos” integrados à rotina da classe para que ele possa se levantar, tomar água, mexer o corpo apagando o quadro, levando um livro para a professora, sendo o ajudante da classe, etc.

*conversar com ele sobre os acontecimentos do dia na escola, sobre as professoras e sobre os colegas, sobre os aprendizados e as tarefas.

Ele continua acompanhando bem as questões acadêmicas agora nesta nova escola? A metodologia de ensino-aprendizado utilizada por esta escola é diferente da antiga? Você consegue identificar diferenças metodológicas?
Os colegas têm recebido a presença de Vini sem julgamentos? Quem tem feito o intermédio das relações entre eles?

Quanto à identificação do que aparece na TV, que ótimo que ele está interessado em encontrar objetos em casa que foram representados na telinha! É como se ele estivesse aumentando os registros de sua biblioteca visual e verbal! Eu procuraria assistir com ele com uma atitude de muita leveza e entusiasmo. Quando vocês não tivessem tempo para ver o objeto, para identificá-lo e nomeá-lo, ou não tivessem o objeto em casa, poderiam fazer uma anotação em um papel na frente do Vini, de forma sincera e entusiasmada, desenhando o que tinham visto, ou anotando o nome do programa onde tinha passado, registrando a informação que pudessem. Quando ele chorasse, eu ofereceria uma resposta mínima, lenta e calma, demonstrando para ele não entender por que ele estava chorando já que chorar não o ajudaria a conseguir o que quer, que é aquela informação “X”. Em outras situações em casa, eu procuraria ser o modelo social da flexibilidade quando não conseguimos algo que queremos, por exemplo, uma informação que não conseguimos obter. Dois adultos em casa poderiam atuar demonstrando para ele que um queria uma informação (ou objeto) que o outro não tinha, e ambos permaneceriam confortáveis e calmos na situação, encontrando alternativas ao que não tinham naquele momento.  Eu também procuraria, neste momento, fazer com que o Vini tenha mais acesso a DVDs ou programas gravados do que ao vivo, para que vocês pudessem congelar a imagem e voltar quando desejado.

Se ele continuar tendo bastante dificuldade para lidar com estes momentos na TV ao vivo mesmo com a resposta lenta e calma de vocês ao choro dele, eu restringiria um pouco mais o acesso à TV até que ele estivesse mais pronto para lidar com a experiência. E brincaria de identificar objetos dentro de casa, sem a TV ligada, talvez com o apoio de fotos e desenhos, gincanas de adivinhação e identificação de objetos.

Ah! Lembrei de uma observação que gostaria de fazer. Adorei a atitude positiva, animada e carinhosa da pessoa que celebrou o Vini durante o “jogo da velha” na escola. Eu apenas sugiro que, nos jogos de competição, valorizemos a participação mais do que o fato de ganhar ou perder, não apenas para o Vini, mas para todas as crianças da sala. Queremos que o Vini compreenda perfeitamente o mecanismo do jogo, e que sinta prazer em jogar, seja ganhando ou perdendo. Todos seriam celebrados por suas participações!

Kita, por favor me fale sobre o que acha das sugestões de estratégias e se tem alguma dúvida. Eu adoraria saber notícias durante o processo de aplicação destas estratégias ou de outras que vocês venham a escolher para estas questões discutidas.
Nos veremos em breve! Eu adoraria rever o Vini e o Adriano!
Muito obrigada pela divulgação do workshop que vocês vêm fazendo em seu estado! E parabéns pelo trabalho com a ONG AMORA!!!

Abraços,
Mariana

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